É comum nos círculos liberais ou neo-ortodoxos afirmar-se que
Moisés nada tem que ver com a composição do Pentateuco. A maior parte dos
críticos que sustentam essa versão acredita que os ditos livros de Moisés foram
escritos por diversos autores anônimos, tendo início no século ix a.C. e terminando com o "Código
sacerdotal", por volta de 445 a.C. — a tempo de Esdras lê-lo em voz alta
na Festa dos Tabernáculos. Outros especialistas, de modo especial os da escola
da crítica da forma, acham que só pequeníssima parte do Pentateuco foi escrita
até o tempo de Esdras, ainda que algumas partes tenham existido antes sob a
forma de tradição oral, durante séculos — talvez remontando ao tempo do próprio
Moisés. Tendo em vista o consenso entre os especialistas não-evangélicos de que
as vindicações da autoria mosaica são todas especiosas, é bom que façamos pelo
menos uma breve reafirmação da evidência sólida e irresistível, tanto interna
como externa, de que o Pentateuco inteiro é obra autêntica de Moisés, sob a
inspiração do Espírito Santo.
Testemunho bíblico
da autoria mosaica
O Pentateuco com freqüência refere-se a Moisés como seu
autor, a começar por Êxodo 17.14: "Depois o Senhor disse a Moisés: 'Escreva isto num rolo, como
memorial, e declare a Josué que farei que os amalequitas sejam esquecidos para
sempre debaixo do céu'". Em Êxodo 24.4, lemos: "Moisés, então,
escreveu tudo o que Senhor dissera".
Lemos, ainda, no versículo. 7: "Em seguida, leu o Livro da Aliança para o
povo...". Outras referências ao fato de Moisés ter escrito o Pentateuco
encontram-se em Êxodo 34.27, Números 33.1, 2 e Deuteronômio 31.9, das quais, na
última temos: "Moisés escreveu esta lei e a deu aos sacerdotes...".
Dois versículos adiante, encontramos uma exigência severa a respeito do futuro:
"... quando todo o Israel vier apresentar-se ao Senhor, o seu Deus, no local que ele escolher, vocês lerão
esta lei perante eles para que a escutem". Essa norma sabidamente percorre
Êxodo, Levítico, Números e a maior parte de Deuteronômio (pelo menos até o
capítulo 30).
Mais tarde, após a morte de Moisés, o Senhor deu estas instruções
a Josué, sucessor de Moisés: "Não deixe de falar as palavras deste Livro
da Lei e de meditar nelas de dia e de noite, para que você cumpra fielmente
tudo o que nele está escrito. Só então os seus caminhos prosperarão e você será
bem-sucedido" (Js 1.8). Negar a autoria de Moisés significa que todos os
versículos acima citados são infundados e indignos de aceitação. Josué 8.32-34
registra que a congregação de Israel estava reunida fora da cidade de Siquém,
no sopé do monte Ebal e do monte Gerizim, quando Josué leu em voz alta a lei de
Moisés, escrita em tábuas de pedra, e os trechos de Levítico e de Deuteronômio
referentes às bênçãos e às maldições, como Moisés havia feito anteriormente
(cf. Dt 27 e 28). Se a hipótese documentária estiver correta, esse relato
também deve ser rejeitado por se tratar de mera invencionice. Outras
referências do at à autoria
mosaica do Pentateuco são 1 Reis 2.3; 2 Reis 14.6; 21.8; Esdras 6.18; Neemias
13.1; Daniel 9.11-13 e Malaquias 4.4. Todos esses testemunhos também deveriam
ser totalmente rejeitados por se tratar de erros.
Cristo e os apóstolos igualmente deram testemunho inequívoco
de que Moisés foi o autor da Torá [Lei]. Em João 5.46, 47, Jesus
disse: "Se vocês cressem em Moisés, creriam em mim, pois ele escreveu a meu
respeito. Visto, porém, que não crêem no que ele escreveu, como crerão no que
eu digo?". Deveras! De maneira semelhante, em João 7.19, Jesus disse:
"Moisés não lhes deu a Lei? No entanto, nenhum de vocês lhe obedece. Por
que vocês procuram matar-me?". Se a confirmação de Cristo de que Moisés
foi de fato o autor do Pentateuco é descartada — como de fato o faz a teoria da
crítica moderna —, segue-se indubitavelmente a negação da autoridade do próprio
Cristo. Pois, se o Senhor estava enganado a respeito de uma verdade histórica
desse tipo, poderia enganar-se também a respeito de princípios e doutrinas que
estivesse ensinando. Em Atos 3.22, Pedro diz a seus compatriotas: "Pois
disse Moisés: 'O Senhor Deus lhes levantará dentre seus irmãos um profeta como
eu; ouçam-no em tudo o que ele lhes disser' (cf. Dt 18.15). Afirmou Paulo, em
Romanos 10.5: "Moisés descreve desta forma a justiça que vem da Lei: 'O
homem, que fizer estas coisas viverá por meio delas"'. Mas a teoria jedp de
Wellhausen, e a crítica moderna racionalista negam que Moisés tenha escrito
quaisquer dessas coisas. Isso significa que Cristo e os apóstolos estavam
totalmente enganados ao julgar que Moisés as tenha escrito de fato. Um erro
dessa categoria, tratando-se de fatos históricos que podem ser atestados,
levanta séria dúvida quanto a poderem os ensinos teológicos, que tratam de
assuntos metafísicos, fora de nossa capacidade de comprovação, ser aceitos como
dignos de confiança ou plenos de autoridade. Assim, vemos que confirmar Moisés
como escritor do Pentateuco é assunto da maior importância para o cristão, pois
a autoridade do próprio Cristo está em jogo.
Evidência interna da composição mosaica
Além dos testemunhos diretamente oriundos dos trechos do
Pentateuco mencionados acima, temos o testemunho de alusões fortuitas a
acontecimentos ou questões da época, a situações sociais ou políticas ou a
assuntos relacionados ao clima ou à geografia. Quando todos esses fatores são
pesados de modo imparcial e correto, chega-se à seguinte conclusão: o autor
desses livros e seus leitores devem ter vivido no Egito. Além disso, esses
fatores revelam que tiveram pouco ou nenhum conhecimento direto da Palestina, dela
sabendo apenas por meio de tradições orais, vindas de seus antepassados.
Citamos as seguintes evidências:
1. O clima e as condições atmosféricas mencionados no Êxodo
são tipicamente egípcios, não palestinos (cf. a referência à seqüência da
colheita, em relação à praga da saraiva, em Êxodo 9.31, 32).
2. As árvores e os animais a que se faz referência de Êxodo a
Deuteronômio são todos naturais do Egito ou da península do Sinai, e nenhum
deles é peculiar à Palestina. A árvore chamada acácia é nativa do Egito e do
Sinai, mas dificilmente se encontra em Canaã, exceto ao redor do mar Morto.
Essa árvore forneceu madeira para grande parte do mobiliário do tabernáculo. As
peles com que o exterior do tabernáculo foi recoberto eram de um animal chamado
taḥaš, ou dugongo,
que é estranho à Palestina, mas encontrado nos mares adjacentes ao Egito e ao
monte Sinai. Quanto à lista de animais limpos e imundos que encontramos em
Levítico 11 e em Deuteronômio 14, alguns são peculiares à península do Sinai,
como o dîśōn, ou ovelha
montês (Dt 14.5), o ya‘anāh, ou avestruz (Lv 11.16), e o te’ô, ou
antílope selvagem (Dt 14.5). É difícil imaginar como uma lista desse tipo
poderia ter sido feita nove séculos depois, em uma terra onde não havia nenhum
desses animais.
3. Mais conclusivas ainda são as referências geográficas que
anunciam perspectivas de uma pessoa não familiarizada com a Palestina, mas boa
conhecedora do Egito. 1) Em Gênesis 13.10, em que o autor deseja transmitir aos
leitores como era verde o vale do Jordão, ele o compara a uma localidade bem
conhecida da região oriental do delta do Nilo, perto de Mendes, entre Busiris e
Tânis. Declara ele que o vale do Jordão era "como a terra do Egito, como
quem vai para Zoar" (egip., T-; -r). Nada poderia ser mais
evidente, com base nessa referência casual, que o fato de o autor estar
escrevendo para um grupo de pessoas não familiarizadas com a aparência das
regiões da Palestina, mas pessoalmente familiarizadas com a aparência do baixo
Egito. Tal familiaridade só poderia ter se desenvolvido no próprio Egito, e
isso se enquadra muito bem à datação mosaica para a composição do livro de
Gênesis.
2) A fundação de Quiriate-Arba (nome pré-israelita de Hebrom,
no sul de Judá), segundo Números 13.22, ocorreu "sete anos antes de Zoã,
no Egito". Isso implica com toda a clareza que os leitores de Moisés
estavam bem cientes da data da fundação de Zoã, mas desconheciam a data em que
Hebrom — que se tornaria uma das mais importantes cidades de Israel após a
conquista — havia sido fundada.
3) Em Gênesis 33.18 há uma referência à "cidade de
Siquém, em Canaã". Para um povo que havia vivido na Palestina mais de sete
séculos a partir da conquista (de acordo com a data atribuída a essa passagem
pela escola de Wellhausen), parece-nos estranho ser preciso dizer que uma
cidade tão importante como Siquém ficava "em Canaã". Todavia, seria
perfeitamente cabível a um povo que ainda não se houvesse estabelecido ali —
como era o caso do povo conduzido por Moisés.
4. A atmosfera e a ambientação do deserto prevalecem por toda
a narrativa, desde Êxodo 16 até o fim de Deuteronômio (conquanto haja algumas
referências à agricultura, como previsões das condições da terra que logo o
povo haveria de conquistar). A importância atribuída a um grande tabernáculo
(tenda) como lugar central de culto e reunião dificilmente teria pertinência a
um público leitor que houvesse vivido na Palestina mais de sete séculos e só
estivesse familiarizado com o templo de Salomão ou com o de Zorobabel como
santuário central. A explicação de Wellhausen para isso, que o tabernáculo era
simplesmente extrapolação artificial do templo, não se harmoniza aos fatos. O
templo era muito diferente em tamanho e no mobiliário, em comparação ao
tabernáculo descrito na Torá. Todavia, nem mesmo essa teoria de ficção
histórica explica por que os contemporâneos de Esdras teriam estado tão
interessados num mero tabernáculo a ponto de a ele devotar tantos capítulos em
Êxodo (25-40) e a ele referir-se em quase três quartas partes de Levítico e
também com tanta freqüência em Números e em Deuteronômio. Não se consegue
encontrar em toda a literatura mundial outro exemplo de tamanha atenção dada a
uma estrutura que na verdade (segundo Wellhausen) jamais existiu e nunca
exerceu influência sobre a geração para a qual aqueles textos foram escritos.
5. Há grande evidência de natureza técnica e lingüística que
se pode reunir em apoio da existência de um contexto egípcio para todo o texto
da Torá. Podem-se encontrar exemplos cheios de minúcias a esse respeito
em meu livro Merece confiança o Antigo Testamento? Basta que se diga que
existe um enorme número de nomes egípcios e de palavras tomadas de empréstimo
da língua egípcia que se encontram mais no Pentateuco que em qualquer outra
seção das Escrituras. Isso é o que se poderia esperar de um autor que, educado
no Egito, escrevesse para um povo nascido e vivido nesse mesmo ambiente.
6. Se o Pentateuco tivesse sido escrito entre os séculos ix e v
a.C, como crê e ensina aquela escola documentária, e extrapolasse as práticas
religiosas e as perspectivas políticas dos séculos v e vi, indo
até os tempos de Moisés (mediante uma mentira piedosa), seria razoável esperar
que esse documento espúrio, forjado muito tempo depois de Jerusalém tornar-se a
capital do reino israelita, ter-se-ia referido a Jerusalém por esse nome em
muitas ocasiões. É certo que teria incluído algumas profecias sobre as futuras
conquistas dessa cidade e de sua situação privilegiada como localidade
permanente do templo de Iavé. Entretanto, um exame minucioso de todo o texto de
Gênesis até Deuteronômio leva-nos à espantosa conclusão de que o nome de
Jerusalém jamais é mencionado. É certo que o monte Moriá aparece em Gênesis 22
como o local em que Abraão tentou oferecer o filho Isaque em sacrifício, mas
nenhuma idéia existe ali de que aquele seria o local do futuro templo. Em
Gênesis 14, há uma referência a Melquisedeque como "rei de Salém" —
não de "Jerusalém" —, mas tampouco temos aqui algum indício de que
mais tarde essa cidade haveria de tornar-se a capital política e religiosa da
comunidade hebraica. Em Deuteronômio 12.5-18, encontramos referências a um
"local que o Senhor, o seu
Deus, escolher dentre todas as tribos para ali pôr o seu Nome e sua habitação.
Para lá vocês deverão ir". Tais referências, é verdade, são tão genéricas
que podem incluir cidades como Siló e Gibeom, em que o tabernáculo foi guardado
por longos períodos antes da construção do templo de Salomão. Entretanto, é
justo presumir que Deuteronômio 12.5 tenha a intenção de prever o
estabelecimento do templo de Jerusalém. No entanto, é quase impossível explicar
as razões por que essa obra de Moisés, alegadamente espúria, escrita muito mais
tarde do que se supõe, deixe de mencionar Jerusalém pelo nome, embora houvesse
muitas razões para que esse nome ali constasse. Só a suposição de que a Torá
é autenticamente mosaica, ou pelo menos composta muito antes da conquista
de Jerusalém (ano 1000 a.C.), pode explicar a ausência do nome dessa cidade.
7. Ao datar documentos literários, é da maior importância
avaliar os termos-chave aparentemente em uso na época em que o autor executou
seu trabalho. No caso de um livro religioso, os títulos pelos quais Deus é
caracteristicamente chamado assumem grande importância. Durante o período entre
850-450 a.C, encontramos crescente realce atribuído ao título de yhwh ṣeḇa’ôṯ (na maior parte das vezes traduzido em nossas versões por
"Senhor dos Exércitos").
Esse nome confere especial realce à onipotência do Deus da aliança de Israel e
ocorre cerca de 67 vezes em Isaías (final do século viii a.C), 83 vezes em Jeremias (final do século vii e início do vi a.C), treze vezes nos dois capítulos de Ageu (final do
século vi a.C.) e 51 vezes nos
quatorze capítulos de Zacarias (final do século vi
e início do v a.C). Esses profetas
cobrem quase todo o tempo durante o qual o texto do Pentateuco estaria sendo
composto, na forma dos manuscritos ), e,
d e p. Entretanto, é de
espantar que nem uma única vez o título "Iavé dos Exércitos" se
encontre no Pentateuco inteiro. Da perspectiva da ciência da literatura
comparada, esse fato seria considerado a mais forte evidência de que a Torá teria
sido composta numa época em que o título "Iavé dos Exércitos" não era
utilizado. Portanto, toda a Torá, até mesmo o chamado Código
sacerdotal, devem ter sido compostos antes do século viii a.C. Caso essa dedução seja válida,
a hipótese documentária deve ser totalmente abandonada.
8. Se a parte do Pentateuco chamada Código sacerdotal foi
de fato composta nos séculos vi e v a.C, seria de esperar que algumas
instituições caracteristicamente levíticas e certos valores culturais do povo,
introduzidos a partir dos dias de Davi, fossem mencionados com alguma
freqüência. Dentre estes estariam os corais, formados pelos cantores do templo,
os quais Davi organizou lançando 24 sortes (1Cr 25), e aos quais tantas
referências se fazem nos títulos dos Salmos. No entanto, nenhum coral
organizado por cantores levíticos é mencionado uma única vez na Torá.
A ordem dos escribas (sōpērîm)
certamente teria sido mencionada", pois o grande chefe deles, o próprio
Esdras, estaria concluindo grandes porções do Pentateuco, a tempo de
celebrar-se a Festa dos Tabernáculos, em 445 a.C. — segundo a hipótese de
Wellhausen. Entretanto, por alguma estranha razão, nenhuma referência se
percebe, de modo algum, à ordem dos escribas nem à função deles, tampouco um
indício profético de que um dia haveria de existir um corpo de guardiães do
texto sagrado.
A partir da época de Salomão, passou a existir uma importantíssima
classe de serviçais no templo, conhecidos por netinins ("os que foram
dados", i.e., dados para o serviço do Senhor no templo). O número dos
netinins (392), que se uniram aos 42 mil que retornaram da Babilônia em 538
a.C, está incluído nas estatísticas de Esdras 2.58 e de Neemias 7.60, ao lado
da contagem dos levitas e dos sacerdotes. No entanto, não existem referências a
eles ou previsão a respeito deles no "Documento p". Que estranho!
Desde o tempo de Davi, "o amado cantor de Israel"
(2 Sm 23.1, nvi, nota de rodapé),
fazia-se uso abundante de vários instrumentos musicais (de corda, de sopro, de
percussão — desses três tipos) em relação ao culto público diante de Deus. É
certo que a sanção de Moisés a tão importante característica do culto levítico
deveria aparecer na Torá, tivesse esta sido composta tardiamente, no
século x a.C. ou depois. É de
surpreender, no entanto, que não exista uma única referência a instrumentos
para acompanhamento musical no culto do tabernáculo. É impossível harmonizar
esse fato com a data de uma composição do século v a.C. Não resta a menor dúvida de que um corpo sacerdotal
profissional como esse, descrito pelos autores da crítica documentária, teria
tido a maior das motivações para se incluir tais instituições, tão queridas
entre as ordenações, de "Moisés".
9. O Pentateuco, especialmente Deuteronômio, contém várias
referências à futura conquista de Canaã pelos descendentes de Abraão. O autor
de Deuteronômio escreve, cheio de confiança, que as hostes hebraicas vencerão
toda oposição dentro da terra de Canaã, derrotarão todos os exércitos inimigos
e implodirão todas as cidades que decidirem atacar. Isso se reflete com clareza
nas repetidas exortações para que se destruam todos os templos e santuários
cananeus e tudo se reduza a pó (Dt 7.5; 12.2, 3; cf. Êx 23.24; 34.13).
Visto que todas as nações defendem seus relicários sagrados
com a máxima força de que são capazes, a presunção de que Israel seria capaz de
destruir todos os santuários pagãos por toda a terra presume a supremacia
militar do povo de Iavé após a invasão de Canaã. Em que outra circunstância na
carreira da nação hebréia poder-se-ia nutrir tão grande confiança senão nos
dias de Moisés e de Josué? Aqui, outra vez, a evidência interna aponta
fortemente para uma data de composição coincidente com os dias de Moisés. Nada
mais fora da realidade supor que Josias, em 621 a.C, quando Judá era um
pequenino estado vassalo sob o domínio do Império Assírio, pudesse almejar
destruir todos os altares idólatras, demolir todos os altos (maṣṣēḇāh) e árvores veneradas (’ašērāh) e esmagar
todas as estruturas de templos, reduzindo-os a pó, de norte a sul e de leste a
oeste da Palestina. Como poderia a pequenina colônia que lutava para sobreviver
esperar eliminar todos os relicários religiosos de Dã até Berseba?
A única conclusão que se pode tirar das ordens exaradas no
Pentateuco para que destruíssem todos os traços da idolatria é que estava na
capacidade militar de Israel o poder de fazer cumprir essas ordens por todo o
país. Nada, porém, seria menos cabível nos dias de Zacarias, de Esdras e de
Neemias que planejar e executar tão grande extirpação do culto idólatra em toda
a Palestina. A grande batalha deles era a sobrevivência, em face das reiteradas
más colheitas e de grandes hostilidades por parte das nações vizinhas. Nem o
"Documento p" do tempo
de Esdras nem o Deuteronômio dos dias de Josias poderiam harmonizar-se com as
passagens aqui mencionadas.
10. Deuteronômio 13.2-11 prescreve a pena de morte por
apedrejamento para qualquer idólatra ou falso profeta, fosse irmão, esposa ou
filho. Os versículos seguintes (12-17) dizem que até mesmo uma cidade toda que
se voltasse para a idolatria deveria ter todos dos seus moradores sentenciados
à morte. Todas as suas casas deveriam ser reduzidas a pó e cinza e todas as
propriedades condenadas a essa excomunhão. Isso não é teoria visionária, mas
ordem séria com procedimentos investigativos nela embutidos, o que refletia um
programa que deveria ser posto em execução no Israel da época. No entanto,
quando examinamos o registro bíblico da situação espiritual de Judá no século vii a.C. (ou, na verdade, no século viii, a partir do tempo de Acaz),
descobrimos que a adoração aos ídolos era tolerada em quase todos os recantos
do reino — exceto durante a reforma religiosa empreendida por Ezequias e por
Josias. Isso teria induzido à destruição de todas as cidades e vilas,
incluindo-se Jerusalém. Ninguém cria leis cuja implementação seja totalmente
impossível de ser executada, por causa das condições reinantes. A única época
em que tal legislação poderia ter sido posta em vigor era a dos dias de Moisés
e de Josué — e possivelmente nos dias de Davi. (Já nos dias de Salomão, o culto
às relíquias nos "lugares altos" estava sendo praticado.)
Qualificações de Moisés como autor do Pentateuco
Tendo em mente as referências bíblicas à educação acadêmica
de Moisés, torna-se logo patente que ele possuía as qualificações exatas para
empreender uma obra do porte da Torá.
1. Moisés recebeu excelente formação, como príncipe criado na
corte do Egito (At 7.22), num país em que a cultura era superior a de qualquer
outra nação do Crescente Fértil. Até mesmo os cabos dos espelhos e das escovas
de dente eram adornados com inscrições hieroglíficas, bem como as paredes de
todos os prédios da administração pública.
2. De seus ancestrais israelitas, Moisés deve ter recebido as
leis orais que eram obedecidas na Mesopotâmia, de onde Abraão viera.
3. De sua mãe e parentes consangüíneos, Moisés deve ter
recebido conhecimento pleno da vida dos patriarcas, desde Adão até José e, com
base nessa riqueza, a tradição oral, teria recebido todas as informações
contidas no livro de Gênesis, por estar sob a orientação do Espírito Santo ao
redigir o texto inspirado da Torá.
4.Tendo residido por muitos anos no Egito e também na terra
de Midiã, no Sinai, Moisés teria adquirido conhecimento pessoal sobre o clima,
as práticas agrícolas e as peculiaridades geográficas, tanto do Egito quanto da
península do Sinai, o que se torna óbvio por todo o texto dos quatro livros —
Êxodo a Deuteronômio —, que descrevem o mundo do século xv a.C., nas vizinhanças do mar Vermelho e do rio Nilo.
5. Sendo designado por Deus para ser o fundador de uma nova
nação, nação que deveria ser governada pela lei concedida por Iavé, Moisés
teria tido o máximo de incentivo para compor essa obra monumental, incluindo-se
Gênesis, com todos os relatos integrais do relacionamento gracioso de Deus com
os ancestrais dos israelitas antes da migração da família de Jacó para o Egito.
E, visto que a jovem nação deveria ser governada segundo as leis de Deus, em
vez de por um déspota real, à semelhança das nações pagãs circunvizinhas,
Moisés recebeu a responsabilidade de compor (sob inspiração e orientação de
Deus) uma lista cuidadosamente pormenorizada de todas as leis que Deus havia
concedido, a fim de que o povo guiasse pelo caminho da justiça, da piedade e do
culto. Ao longo de um período de quarenta anos de peregrinação no deserto,
Moisés teve todo o tempo e oportunidade de que precisava para esboçar o sistema
integral de leis religiosas e civis que Deus lhe havia revelado, as quais
serviriam de constituição para a nova comunidade teocrática.
Portanto, Moisés tinha todos os incentivos e todas as
qualificações para compor essa obra magnífica.